Após
trinta anos (Lc 3,23) de vida escondida em Nazaré, Jesus se apresenta ao povo
com a sua mensagem (Lc 4,18). Em Nazaré, ele tinha convivido longos anos (Lc
2,51) com os agricultores da Galiléia, explorados pelo sistema dos impostos
herdado dos persas e dos gregos e pelo latifúndio criado pelos romanos. Ele
mesmo era carpinteiro (Mc 6,3). Enquanto crescia (Lc 2,40) em sabedoria, idade
e tamanho diante de Deus e dos homens (Lc 2,52), assistia às explosões de
violência tão comuns na Galiléia, à progressiva organização dos Zelotes, à
transferência da capital do seu país para Tiberíades, às tentativas
infrutíferas dos romanos para reduzir à obediência o povo rebelde da Galiléia.
Via
como os escribas e os fariseus reuniam e organizavam o povo em torno das
sinagogas, ensinando-lhes a tradição dos antigos (Mc 7,1-5), dando-lhes força
para resistir, preparando-os para a próxima vinda do Messias, aguardado por
todos como iminente. Via também como eles, em vez de ensinar a lei de Deus e
revelar a face do Pai, a escondiam atrás de uma cortina espessa de normas e
obrigações que tornavam impossível a observância da lei para os pobres (Mc
7,6-13). Estes se viam condenados por seus líderes como ignorantes (Jo 7,49) e
pecadores (Jo 10,34).
Via
ainda a piedade confusa e resistente dos pobres, tão bem expressada no cântico
de Maria (Lc 1,46-55) e na esperança difusa de um novo êxodo. Os pobres
esperavam que chegasse o tempo da libertação prometida desde os tempos antigos
(Lc 1,71-73).
Crescendo
no meio desta realidade conflitante de exploração econômica, de convulsões
sociais, de desintegração crescente das instituições, de explosões messiânicas,
Jesus, unido ao Pai, torna-se aluno dos fatos, descobre dentro deles a chegada
da hora de Deus e anuncia ao povo: “Esgotou-se
o prazo! O Reino de Deus está ai! Mudem de Vida! Acreditem nesta Boa Notícia!”
(Mc 1,15).
O
Programa da pregação que fazia do Reino, Jesus o apresenta na sinagoga de
Nazaré: “O Espírito do Senhor está sobre
mim, porque ele me ungiu para anunciar a Boa Notícia aos pobres, enviou-me para
proclamar a remissão aos presos e aos cegos a recuperação da vista, para
restituir a liberdade aos oprimidos, e para proclamar um ano de graça da parte
do Senhor” (Lc 4,18-19).
Conforme
o Evangelho de Marcos, a Boa Notícia do Reino anunciada por Jesus tem como
primeiro efeito congregar as pessoas em torno a Jesus e entre si, isto é,
formar comunidade (Mc 1,16-20); o segundo efeito é fazer surgir consciência
crítica no povo oprimido frente aos seus líderes (Mc 1,21-22); o terceiro
efeito é combater o poder do mal, expulsá-lo e, assim, libertar o homem (Mc 1,23-28);
o quarto efeito é restaurar e salvar a vida do povo para o serviço (Mc
1,29-34); o quinto efeito é permanecer unido à raiz que é o Pai, através da
oração (Mc 1,35); o sexto efeito é manter a consciência da missão e não se
fechar nos resultados obtidos (Mc 1,36-39); o sétimo resultado é libertar e
reintegrar os marginalizados (Mc 1,40-45).
Jesus
se apresenta como quem vem realizar as esperanças do povo, suscitadas e
alimentadas, ao longo dos séculos, pelos profetas. Ele se apresenta como o
Messias-Servo anunciado por Isaías (Is 42,1-9; 61,1-2). Propõe a realização de
um ano jubilar, “um ano de graça por
parte do Senhor” (Lc 4,19). O ano jubilar já fora tentado por Nehemias, sem
muito resultado (cf Neh 5). O ano jubilar é a tentativa de reorganizar todas as
coisas, para que o povo pudesse recomeçar tudo de novo e realizar a aliança com
Deus que tinha sido quebrada pela infidelidade.
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